Artigo publicado em 04/04/2016 na coluna de Marcia Dessen para o Jornal Folha de S. Paulo
Vai passar um tempo trabalhando no exterior? Está pensando em tentar a vida em outro país? Tudo bem, mas a Receita Federal precisa saber. Se o afastamento for superior a 12 meses, aos olhos da Receita você passa a ser não-residente fiscal, sujeito a regras distintas das aplicáveis aos brasileiros residentes. Conversei com a advogada Luciana Navarro Pantaroto, do escritório Dian & Pantaroto, especialista no assunto.
VOU EMBORA DE VEZ
Para encerrar sua residência fiscal no Brasil, duas providências: entregar a Comunicação e a Declaração de Saída Definitiva do País. Parecem a mesma coisa, mas não são.
A Comunicação de Saída Definitiva do País é feita pelo site da Receita a partir da data de saída até o final de fevereiro do ano seguinte. A Declaração de Saída Definitiva do País deve ser entregue entre março e abril do ano seguinte usando o mesmo programa anualmente colocado à disposição para as declarações do imposto de renda. A partir desse momento cessa sua obrigação de entregar declaração de ajuste anual à Receita Federal no Brasil. Tem outro leão esperando você.
Sua nova condição de não-residente deve ser comunicada a todas as fontes pagadoras de rendimentos; a tributação sobre eles vai mudar. Além da empresa onde trabalha, se for o caso, avise também, bancos e instituições financeiras onde possua contas, investimentos, planos de previdência privada, e imobiliárias que agenciam contratos de aluguel de imóveis.
A conta-corrente que você vai manter por aqui passa a ser uma conta CDE Conta de Domiciliado no Exterior, com regras específicas para esse tipo de conta. Converse com seu banco para saber o que muda.
LEÃO NÃO GOSTOU
Não se iluda, apesar de não-residente, você vai continuar pagando imposto por aqui. Rendimentos recebidos por pessoa jurídica são tributados na fonte. Os recebidos por pessoas físicas, aluguéis de imóveis por exemplo, são tributados pelo carnê-leão na data do recebimento, utilizando código e tributação específicos para não-residentes.
Esqueça tudo o que você sabe sobre tributação no Brasil. Muitas das regras para brasileiros residentes, não se aplicam aos não-residentes. Sabe aquele VGBL que você comprou com a tabela regressiva para pagar somente 10% de imposto depois de 10 anos? Então, na condição de não-residente, a tributação será na fonte, com alíquota fixa de 25%.
Outro exemplo é a perda do benefício de isenção sobre o ganho de capital na venda de imóvel. Fundamental consultar um advogado tributarista ou um planejador financeiro com conhecimento no assunto para um planejamento tributário adequado.
E como sua história com o Brasil não termina, é bom nomear um procurador, residente no Brasil, para representá-lo perante a Receita Federal e outras instituições.
TRIBUTOS LÁ FORA
Pesquise como funciona a tributação do novo país de residência. Alguns países possuem acordo com o Brasil para evitar dupla tributação, o que pode aliviar a carga tributária em algumas situações.
Se você está indo a trabalho, saiba que o Brasil firmou acordos previdenciários com alguns países que possibilitam, em situações específicas, que as contribuições à seguridade social sejam pagas apenas em um dos países durante o período no exterior. O tempo de contribuição pode ser considerado para receber o benefício de aposentadoria em ambos os países.
DE VOLTA AO BRASIL
Decidiu voltar? Muito fácil recuperar sua condição de residente fiscal no Brasil, basta entregar uma nova declaração de ajuste anual. Deixou conta bancária, investimentos e imóveis no exterior? Declare este patrimônio à Receita Federal quando voltar.
Eventuais rendimentos como salário, aposentadoria, juros, dividendos e ganhos de capital recebidos no exterior são tributáveis aqui, exceto as situações previstas nos acordos. Via de regra, a tributação sobre rendimentos no exterior deve ser feita no mês seguinte ao recebimento.
É importante procurar um especialista em tributação para que os ativos, dívidas e rendimentos no exterior sejam reportados e eventualmente tributados de acordo com a legislação tributária brasileira, especialmente no que diz respeito a taxas de conversão dos valores em moeda original para o Real.
Tomara que seja boa sua vida fora do Brasil! Diferente, posso garantir que será.
Marcia Dessen, com colaboração de Luciana Pantaroto